Mudar tudo para ficar quase na mesma

Numa altura em que estamos prestes a entrar no novo ano, multiplicam-se os balanços e as listas de acontecimentos que destacam o ano de 2015. É altura de perspetivar oportunidades, formular desejos de mudança e de renovação, sonhar projetos e acreditar que, desta vez, tudo será diferente. É também contagiado por este clima de ilusões típicas desta época do ano, que decidi deixar-vos aqui algumas conclusões.

Este ano termina com um novo Governo socialista, suportado pelo PCP, BE e PV, resultante de um “entendimento à esquerda” no Parlamento. E o novo ano inicia com mais uma campanha eleitoral, desta vez para escolher o novo presidente da República. O sucessor de Cavaco Silva no Palácio de Belém poderá vir a ter um papel crucial, se os equilíbrios que suportam o Governo liderado pelo António Costa se revelarem precários.

Quando falta menos de um mês para as eleições presidenciais, são 10, os candidatos na corrida a Belém. Marcelo Rebelo de Sousa parte na pool position, com uma confortável vantagem sobre as restantes candidaturas. Apesar da sua popularidade, o favoritismo do Professor Marcelo é só na primeira volta, visto que numa eventual segunda volta, o eleitorado da esquerda possa unir-se para votar na Maria de Belém ou Sampaio da Novoa. No entanto, é pouco provável que a tentação de olhar para Belém como contrapeso de São Bento influencie o desfecho das presidenciais.

O ano de 2015 não acaba sem a falência de mais um banco, o BANIF. E também não esqueçamos, que o Estado continua sem solução para o Novo Banco. Desta vez, são pelo menos 2,4 mil milhões de euros que vão custar aos contribuintes para salvar o BANIF. A opção, política, foi proteger os depositantes em detrimento dos contribuintes com o argumento de que a falência do Banif punha em causa a sustentabilidade do sistema financeiro. Afinal para que serve um fundo de garantia de depósitos se o mesmo nunca é usado? Apesar do seu impacto na Madeira e Açores, o BANIF, que representa 3% do mercado nacional, não deixa de ser um pequeno banco como era o BPN. E também não acho nada de outro mundo, se tivessem que optar por retirar uma percentagem dos depósitos acima de 100 mil euros para salvar o banco. Afinal de contas, esses depósitos estariam sempre em risco (até 100 mil) em caso de falência do banco. Quem não tem nada a ver com o BANIF, não tem que estar a pagar a incompetência de todos os intervenientes no caso. É verdade que Mário Centeno não tem culpa neste processo, mas tem, enquanto ministro das Finanças, a obrigação de explicar detalhadamente a todos os contribuintes porque não optou pela liquidação do banco, tal como Bruxelas queria.

Na mensagem de Natal, António Costa insistiu na ideia de um “tempo novo”, acenando a esperança do crescimento económico, da criação de emprego e da consolidação orçamental. O BE, que tem sido o partido mais ativo no apoio dado ao novo Governo, apressou-se a saudar a intervenção e o princípio do fim das políticas de austeridade. A nova composição parlamentar parece criar um cenário favorável à mudança de políticas, no entanto, um mês de governação bastou para deixar no ar o receio de que tudo possa ter mudado para ficar quase na mesma. A resolução para o Banif, a dependência do sistema financeiro e os mais de 11 mil milhões já injectados pelo Estado no sector, tornam difícil acreditar num cenário de relançamento da economia.

No Parlamento, desfez-se em pouco tempo o equívoco de que o país estava mais partido do que nunca em blocos, Esquerda e Direita. Rapidamente esses blocos se quebraram para, consoante os diplomas, o PS se ver obrigado a depender da votação dos deputados do PSD e do CDS-PP.

Por fim, resta-nos aguardar pela apresentação da proposta de Orçamento do Estado, que deverá ocorrer no início do novo ano para perceber o que realmente vem aí. As linhas ainda vagas do programa do novo Governo começam a definir-se à medida que tiverem de ser convertidas em medidas concretas. Por enquanto a apregoada mudança parece estar cada vez mais distante. A mudança sentir-se-á apenas quando o crescimento económico e o emprego deixarem de ser palavras, para serem sentidas pelas pessoas.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Artigos relacionados

Digite acima o seu termo de pesquisa e prima Enter para pesquisar. Prima ESC para cancelar.

Voltar ao topo