DONALD TRUMP, O ABOMINÁVEL CISNE NEGRO

O cisne negro, o altamente improvável Donald Trump ganhou as eleições americanas e tornou-se no 45º Presidente dos EUA, cargo que ocupará a partir do dia 20 de Janeiro de 2017. Era completamente inverosímil que Trump pudesse derrotar os pré-candidatos republicanos e muito menos depois arrasar Hillary Clinton mas o cisne negro conseguiu surpreender tudo e todos.

Trump conquistou a Casa Branca com um discurso anti-imigração, prometendo construir um “grande e belo muro” na fronteira com o México. A sua maior promessa é encerrar os EUA na sua concha de raiz isolacionista e voltar a um passado idílico: Make America Great Again. Evidentemente nada disto é particularmente original se comparado com o discurso dos novos partidos de extrema-direita europeus enraizados num nacionalismo cego e profundamente eurocépticos, como a National Front de Marine Le Pen ou o Alternative für Deutschland de Frauke Petry. Esses e outros líderes de partidos populistas europeus com ideologia semelhantes saudaram entusiasticamente a vitória de Trump, encarado como a vanguarda de um movimento internacional de libertação dos povos, quebrando, desta maneira, o momentum de Clinton.

A campanha eleitoral foi marcada por ataques sucessivos e golpes abaixo de cintura parte a parte mas Trump soube trabalhar o carisma de herói improvável, campeão do povo impotente contra os vícios de um sistema puramente tentacular, que tratou de personificar na sua adversária. Trump impôs-se nos estados decisivos nas eleições americanas, em particular em estados da cintura industrial do Midwest, considerados seguros para os democratas, como Michigan, Pensilvânia, Ohio e Wisconsin, que já em 1984 tinham votado em Ronald Reagan – os chamados Reagan Democrats doravante designados também por Trump Democrats. A abrangência e diversidade da população que elegeu Trump parecem exprimir sinais importantes sobre a evolução política do eleitorado americano assente no cada vez maior afastamento do establishment americano.

Mas vamos por partes: o que aconteceu ao certo para Trump ter vencido estas eleições, à partida irreversivelmente perdidas? Importa analisar, em primeiro lugar, os 2 mandatos de Barack Obama. Ao fim de 8 anos de um Presidente afro-americano, temos uma América com problemas sociais agravados e uma Europa a viver um momento de fragmentação em parte devido ao fluxo de refugiados causados por um imbróglio no Médio Oriente no qual Obama tem graves responsabilidades indirectas. A sua oratória de pregador da igreja evangelista é de facto impressionante e ao mesmo tempo cativante. É um homem genial mas não foi um presidente genial. Prometeu uma mudança que não conseguiu impor. Num outro ponto de vista, Trump não está totalmente errado em tudo o que diz quando acusa a administração democrata de ter “criado” o Daesh. De facto, a saída do Iraque, tal como processada – com data anunciada publicamente, originou uma sensação de falsa calma e permitiu nomeadamente que o governo xiita de Bagdad preparasse uma autêntica purga aos sunitas que acabaria por se repercutir na Europa. O fluxo de refugiados que continuamente desembarcam nas costas do Mediterrâneo teve influência nos resultados do Brexit, alimentando uma bola de neve imparável e cada vez maior de nacionalismos egoístas e europeus anti-europeístas.

Com Clinton no poder, tudo se manteria na mesma. Convenhamos, Clinton não é nem nunca foi santa, era aliás padroeira de um sistema corrompido de que sempre pertenceu e que com ela prevaleceria. Deste modo, Trump sempre foi visto como um outsider num genuíno show eleitoral projectado a priori para transformar Clinton na primeira mulher Presidente dos EUA. Aquilo a que assistimos não foi a cobertura das eleições americanas, mas antes uma vasta campanha publicitária dos media sem precedentes que fizeram o endorsement a Clinton onde até revistas apolíticas como a Variety participaram e onde assistimos a um conluio a Trump nas mais variadas personalidades da alta cúpula do Grand Old Party. Trump foi alvo da maior e mais violenta campanha de ataques pessoais que alguma vez presenciei na minha vida. A eleição deste foi tão-somente o triunfo da democracia e uma derrota inequívoca dos meios de comunicação social. A vitória de

Trump é uma revolução de que ainda está para se perceber o futuro e o seu discurso, ainda que por vezes seja rude, desarticulado e populista, foi sendo interpretado como uma manifestação de audácia e independência, face a uma cultura dominada pelo tabu do politicamente correcto.

Creio que os próximos tempos serão marcados por uma imprevisibilidade latente embora ache que a maioria dos cenários catastróficos e opiniões apocalípticas niilistas que já tive oportunidade de ler na imprensa pública e estrangeira são algo exacerbados. A meu ver, Trump acabará por se tornar lenta mas gradualmente num republicano moderado e liberal, numa espécie de antítese do que foi ao longo de toda a campanha.

A Europa reagiu com desconcerto à eleição de Trump mas talvez seja este o momento que a Europa tanto ansiava. Perante a cada vez mais evidente bicefalia de equilíbrio de poderes no Mundo, entre 2 blocos coesos e ameaçadores, como os EUA de Trump e Federação Russa de Putin, esta parece-me ser a oportunidade de a Europa voltar a ganhar o seu próprio protagonismo político como outrora o teve. Parece-me evidente, portanto, que perante um presidente norte-americano anti-sistema e anti-globalização e um czar russo ávido em ideias expansionistas em termos territoriais, só resta à Europa unir-se e assim salvar-se.

Autor: André Ratinho Pereira. Natural de Lisboa, onde reside, nasceu a 16/07/1993. É licenciado em Ciência Política pelo ISCTE-IUL. É mestre em Economia Monetária e Financeira no ISCTE Business School.
E-mail: andreratinhopereira@gmail.com

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